terça-feira, 25 de junho de 2013

cru (trecho de um conto meu, um conto violento)

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dois dias antes, a morte 

Dalinha entra. A amiga não chegou. Deve estar bebendo com o namorado. 

Louça, roupas, uma barata mais adiante, vou descansar. Tira a roupa. Barriguinha chata. (Gorda?). Será que é essa barriga que não me traz felicidade? Mas os homens me acham gostosa. Quando eu ponho a bermuda ciclista preta, vixe, eles só faltam me comer ali mesmo na rua. Minha bunda é grande. Mas excita. Os homens gostam de comer a gente por trás. Por isso valorizam a bunda. Na verdade, quem só valoriza a bunda, e só a bunda, não consegue encarar a mulher de frente, olhos nos olhos. Não consegue. Na hora do amasso, eles fecham os olhos e me lambem toda. Não, eles não têm tempo de olhar nos olhos. Minha bunda é enorme. Mas excita. Só aos podres homens, só aos podres. Dalinha deita só de calcinha e sutiã. O sofá range. Liga a tevê com o controle remoto. Mas seu pensamento não olha o que está nas imagens televisivas.
Olha para um sorriso que lhe está sorrindo. Dalinha se assusta mas não grita. Ela conhece aquele sorriso. O vulto se aproxima.
- Você está sorrindo de safado, né! Só porque eu tô pelada. Mas eu não ligo, não, pode olhar. Quê que cê veio fazer aqui?
O vulto passa por ela, cruza a sala até a cozinha. Dalinha vai atrás. Entra na cozinha. E vê algo cortando sua garganta. Rápido. Suas mãos agarram o pescoço. As mãos absolutamente vermelhas. O assassino incrivelmente gélido assistindo ao horror de Dalinha. Chorando sem gemer, sem entender. Dalinha,
horrorizada com seu próprio sangue jorrando, não consegue sair do lugar. Se ajoelha e continua apertando o pescoço. Aí ela olha nos olhos do assassino. Ela entende. Entende que vai morrer. Fecha os olhos e espera o golpe final. Ela não vê que o assassino acertou sua cabeça com um taco de madeira, que as crianças usam pra jogar, e o criminoso usou pra rachar o crânio de Dália Deneide Dorval. Foi carregada pra cama. E, cuidadosamente, foi retirado o sutiã, e depois a calcinha. Nua, de pernas abertas, o assassino rasga o envelope de camisinhas, põe uma e investe na falecida. Transa freneticamente.
Insatisfeito, vira a moça, morde sua bunda com inexplicável romantismo, misturado a estocadas violentas quando a penetra por trás. De novo por trás, ele arrebenta o ânus da moça. Parece irritado com isso. A cada estocada ele bate na Dalinha. Socos nas costas. Se cansa. Retira a camisinha com cuidado. Vai ao banheiro e a enrola em papel higiênico, guardando no bolso de dentro de sua capa.
Ele veste a capa, e vai embora, mas antes ele olha a vítima, se aproxima, e chuta-lhe violentamente a bunda.
E desaparece. 

segunda-feira, 17 de junho de 2013

protesto


gritar é sempre o jeito mais fácil para ser ouvido
fácil nem sempre é melhor
mas as mudanças nem sempre começam com o que é melhor

são jovens que transformaram as ruas em arquibancadas

não para torcer para o brasil
mas para criticá-lo

e o brasil criticado não era a seleção.
 esse brasil é dos transportes públicos, dos gastos públicos, e seus impublicáveis valores.

a turma dos 20 centavos grita contra o grupo dos 7 bilhões nos estádios.

o que dá pra fazer com 2,95 no rio... ou 3,20 em são paulo?
o que dá pra fazer com os 7 bilhões que reformaram os estádios?

a polícia, que é povo também, acata ordens. ordens parecidas com às de tempos ditatoriais
disso, pouco mudou. a herança ainda é pesada

há mãos que estrangulam o trato, que partilham o mesmo aperto financeiro ou político
mãos também servem para abraçar a paz, para alcançar os pés, tocar o céu e beijar o mar do futebol

algumas respostas são fantasias de uma grande festa sem convidados, gente sem teto para que houvesse teto no palco da bola
não se conhecem respostas, nem modos, ou tempos adequados
para uma despedida, ou para sonhar, reprimir, protestar, sorrir, fugir ou viver

mas há tempo para aprender tudo isso

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******((esse texto foi editado e foi ao ar no sportscenter - 16/06/13 - e no pontapé inicial da espn-brasil no dia seguinte pela manhã. não posso reproduzir o vídeo, nem dar um link para ele aqui por questões de direitos de imagem de quem comprou a copa das confederações - há imagens no vídeo que pertencem a competição
outra coisa: reutilizei versos meus e os modifiquei para este texto de hoje))

terça-feira, 11 de junho de 2013

de humanos

a paciência é uma virtude. 
a falta de atitude é um defeito. 

tudo o que é sempre desfeito revela ansiedade.
qualidade é não fugir da altitude. 

pude ver que pular do precipício não tem volta.
quem se solta à princípio não é precipitado, 

a menos que tenha registrado princípios inalcançáveis.
estáveis homens são aqueles que não saem do lugar. 

amar sem paciência não é possível.
plausível é passar o dia apaixonado, e, 

à noite, sonhar acordado. 
apaixonado não tem paciência.

mas teu sorriso e toque e pele e cheiro e voz 
acalmam toda frustração boba. 

duro é viver sem isso.

domingo, 9 de junho de 2013

f ô l e g o

essa boca me abraçando avermelhando-se noutro rosto 
essa textura exata noutro lábio rosa noutra boca sangue 
noutro sangue rosa  
noutra  
essa louca movimentação em transe parada que parava 
e não sabia que era tanto até que outros todos santos  
lhe pediram muito que deixasse que beijassem 
todas  
bocas 
nessa boca  
textura exata de pele e carne e cor e sangue e louca e solta e noutra boca se abraçando 
rindo rindos esses lábios menta mentalizarão todos os 
instantes uma fração de uma pintura um tempo neutro  
noutra pintura noutro rosto lindo noutro jeito e hora 
noutra boca rara essa textura louca noutro vermelho exato 
talvez as bocas partam-se em vinte mil frações 
e
sombras talvez venham roçar meus desejos 
talvez 
talvez outro rosto e boca desses beijos noutra vez 
sejam meus

entrebraços

(personagem de um conto meu ainda incompleto)

tenho medo de existir
viver é uma agonia
não há nada pior
do que mexer o braço
e pensar que estou
mexendo o raio do braço
e por culpa do pensamento
eu desisto de mexer
a porra do braço

o medo é meu segredo de existir
e a agonia 
é meu sorriso triste no café da manhã

mas após toda dor
quando vejo que você
de mim não desiste
desacredito de todo descrédito
e me espalho no arco-íris
do nosso amor

correr

viver é não conseguir. porque viver é tentar... a vida é todo o processo de tentativas. é aquela história de que o barato do corredor não é chegar, mas sim, correr. evidentemente que o cara quer chegar, cruzar a linha, e se possível ganhar a corrida. mas quem busca vitórias - e só vitórias - já pensa na próxima corrida (título) quando termina uma. quem pensa na corrida, curte cada passada que dá, cada segundo de suor contra o vento. curte, aproveita, sente, vibra, vive o momento. depois que termina, o corredor apaixonado pensa em correr de novo. quando o cara que só busca títulos tiver conquistado tudo, ou não tiver mais chances de títulos, o que fará? provavelmente estará satisfeito com sua carreira. se aposentará.
o problema é que da vida não podemos pedir aposentaria. seria suicídio.